segunda-feira, 10 de agosto de 2015

Síndrome da queda


Talvez seja a sina de governos que estão decaindo, não sei se há estudos sobre isso. Se não houver, depois do programa do PT será preciso uma análise mais aprofundada da psicologia de governos que perdem o apoio popular e, numa reação de suicídio político, se lançam a desafios que não estão em condições de enfrentar.

Foi assim com Collor, quando convocou o povo a sair às ruas de verde e amarelo para apoiá-lo, e está sendo assim com o governo Dilma, que resolveu, do fundo do poço em que se encontra, ameaçar os oposicionistas pedindo-lhes “juízo” e sugerindo tragédias como consequência de uma crise política que já está implantada, e ao mesmo tempo ridicularizar o panelaço, como a desafiar o povo brasileiro que, de acordo com a mais recente pesquisa Datafolha, tem 71% de cidadãos que rejeitam o governo.

Não há nem mesmo mais a possibilidade de atribuir o descontentamento à elite, pois a rejeição está em todas as classes, em todas as regiões do país, deixando a presidente Dilma com o menor índice de popularidade de um presidente na história recente do país.

O governo da presidente Dilma perde espaço, perde poder, perde a capacidade de administrar o país. Caminhamos para uma séria crise institucional. Não há mais maioria no Congresso para o governo tentar aprovar medidas importantes de seu ajuste fiscal, não há credibilidade do governo, que não consegue se impor politicamente.

A atitude irresponsável do Congresso é corroborada pelo próprio PT, que está aderindo à oposição na votação de medidas claramente contrárias ao governo, como a indexação dos salários da Advocacia Geral da União e outras categorias aos dos ministros do STF. Não há o menor espírito de colaboração do Congresso por que a maioria pensa apenas em salvar a pele, sem se importar com o destino do governo.

Ninguém quer ser sócio de Dilma no desgaste de popularidade, mesmo que esse seja um raciocínio político raso. Num regime parlamentarista, esse governo já teria sido destituído, e convocadas novas eleições. No presidencialismo, estamos à beira de uma crise institucional.

Não existe nenhuma figura no cenário político brasileiro que possa ser ouvido, ou se fazer ouvir, para tentar unificar o país, como apelou o vice-presidente Michel Temer, a figura mais próxima desse modelo pacificador que não se encontra num Congresso que já abrigou políticos do tamanho de Tancredo Neves, Ulysses Guimarães, Thales Ramalho, Petrônio Portella, todos mestres em conciliação política.

Um acordo é muito difícil, sobretudo, por que não existe por parte do governo Dilma a disposição de assumir erros cometidos. O máximo que chegaram perto foi, no programa do dia 6, perguntar retoricamente: “Não é melhor a gente não acertar em cheio tentando fazer o bem do que errar feio fazendo o mal?”.

Na véspera, o chefe da Casa Civil chegara a fazer um apelo patético por um acordo suprapartidário, e ensaiou elogios ao PSDB. No programa do PT, os adversários foram acusados de só pensarem em si, e, pela frase, de fazerem “o mal” propositalmente, enquanto o PT, quando não acerta, é por que está tentando “fazer o bem”.

Tudo isso a 10 dias das manifestações marcadas para todo o país contra o governo Dilma. Se não é provocação, o que será? Difícil entender o movimento político do PT diante da crise que o país vive. Difícil imaginar o que se passa pela cabeça da presidente Dilma quando seu futuro à frente do governo está ameaçado por questões concretas como as contas que o Tribunal de Contas da União (TCU) está examinando, e pelo esfacelamento da base congressual, que não resiste mais à realidade.

O Congresso voltou do recesso mais oposicionista do que nunca, e isso revela o estado de espírito que os parlamentares encontraram em suas bases eleitorais, refletido na pesquisa do Datafolha. Não é simples coincidência que nessa volta o PTB e o PDT tenham pulado do barco governista, e que até o PT vote contra a orientação do governo.





Por Merval Pereira

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